sábado, 27 de março de 2010

O vanguardoso e o comercial: reflexão sobre minhas expectativas do cinema brasileiro



Fiz um esforço pra ver um filme estranho, que já estava na hora. Na minha modesta porém interessante coleção de filmes brazucas, tem um monte dos esquisitos, mas eu andava resistente em assistir. Isso porque tenho a posição mais peculiar em relação ao cinema, que se estende ao teatro. Eu não gosto de coisas fáceis, mas também não gosto de supervanguardoso. Não me interesso por experimentação. Gosto que experimentem e depois me mostrem o resultado, o que foi apredido e revolucionado com a experimentação. E daí passo minha opinião inconsequente...

Mas espera-se que eu possa avanaçar nesse sentido, e deixar de ser uma quadradona. A proposta do ano do cinema brazuca é, entre outras coisas, de abrir minha cabeça pra outras experiência cinematográficas, saca? Então fui lá, apaguei a luz e dei o play pra O bandido da luz vermelha. Trata-se de um filme preto-e-branco de 1968 que conta a história de João Acácio Pereira da Costa, um bandidão que andou aterrorizando São Paulo nos anos 1960, malvadão e cheio de personalidade. Sendo vanguardoso, o filme é barulhento, cheio de efeitos sonoros esquisitos. (Já perceberam como o experimentalismo na arte gosta de deixar a gente desconfortável? Se não der vontade de virar as costas e ir embora, não é vanguardoso o suficiente. Aí o apreciador tem que mostrar que tem estômago, tem que provar que não é um burguês com apetite cultural formatado pelo mainstream, e com isso ganha o prazer de sair da sala de cinema, do teatro ou da Bienal de São Paulo se sentindo um herói dos sentidos perceptivos. (Eu mesma uma heroína, que já enfrentei o desafio da música dodecafônica em algumas repúblicas onde morei. Não é tão incômodo quanto funk carioca.)) A narração do filme é feita por duas vozes, um homem e uma mulher, que ficam completando as frases um do outros, ou fazendo jogos entre eles. Tive a impressão de que as frases ditas pela narração eram manchetes de jornal da época, as coisas mais absurdas, que iam de medo do comunismo a discos voadores. Boa sacada, curti. Foram os efeitos sonoros que me incomodaram mais. Não gosto de barulho.

Lembram das aulas de Literatura na escola, que no Modernismo tinha uma revista de literatura chamada Klaxon? Pois bem, klaxon significa buzina, em francês. Mesmo. Aí era uma coisa supernova, pra frentex essa coisa de buzina, né? Automóvel, velocidade, barulho... a modernidade, certo?

Meio ultrapassado, não acham? Que o vanguardoso seja barulhento? E em 12 anos já vamos comemorar um século da Semana de 1922.

Minha opinião inconsequente...

O que me incomoda um pouco é que a coisa de cinema brasileiro seja meio... como dizer para não chocar Glauber Rocha?... amadora. Ou é redondamente ruim, como as comédias da Globo Filmes e da Warner Brasil, mesmo eu tendo dado risada de A mulher invisível, ou é experimental, vanguardoso, diferentão, marginal. Tomem por exemplo o Cinema Novo. O Glauber é tão controverso que eu tinha um camarada da USP que dizia saber quando estava bêbado porque o mundo começava a ficar parecido com um filme do Glauber Rocha. O Anselmo Duarte só levou a Palma de Ouro por que fez um filme pra agradar a gringaiada. O Joaquim Pedro é bom. É bem bom. Mas é isso que se tem pra mostar como melhor? Eu acho pouco.

O cinema brasileiro está parado no tempo. Eu não sou a primeira pessoa a dizer isso, tem aí embaixo um vídeo do Glauber falando a mesma coisa. Acho uma grande falácia chamar a retomada, com o Carlota Joaquina da Carla Camurati, de "renascimento do cinema brasileiro". O Cinema Novo foi qualquer coisa de fantástico, mas o amadurecimento do cinema nacional parou ali. Tomando-o como ponto de partida para arte do cinema no Brasil, era pra gente estar fazendo maravilhas! O que foi que aconteceu? A pergunta não é retórica, o que foi que aconteceu? Onde está o problema? É no público? É na produção? É o imperialismo capitalista que transformou a cultura em mercado de massa? Novamente, minhas perguntas não são retóricas.




Salve geral. Eu vi Salve geral logo depois de O bandido da luz vermelha. Coisa fina, o filme. História bacana, personagens interessantes, bons atores, filme bem-feito etc etc etc. E o melhor, apesar de ser um filme sobre violência - como, no Brasil, não se fazer arte sobre violência?, seria fechar os olhos e lavar as mãos - mas não tinha aquela apologia estranha, embora divertida, de que a violência é uma brasilidade, como em Tropa de elite e Cidade de Deus (que são dois filmes que me agradam muito).

Salve geral queria o Oscar de melhor filme estrangeiro. E daí aconteceu o quê? O que não pode acontecer em Copa do Mundo: perdemos pros Argentinos. Como isso pôde acontecer? Babys, vocês têm visto o que os hermanos estão fazendo do lado de lá? Isso no meio da puta zona que tá a terra deles, os caras ainda têm tempo de identificar um bom roteiro, uma boa proposta, sentar e filmar o troço todo com calma. Tem saído um filme mais bacana que o outro, lá. Coisas simples, cheias de qualidade. Nada do outro mundo. Vi um filminho num canal Tele Cine outro dia, de madrugada, nem peguei o nome do filme. Era uma história sobre paternidade, sobre um moço que tinha acabado de virar pai (um molequinho de 3 ou 4 anos) e que tinha a mesma profissão do pai dele. Aí o vovô morre. Simples assim. Muito bacana.

Como balanço geral de Salve geral, ele é um filme simples e muito bom. Meu tipo de coisa. Bom, não dá pra colocar na categoria dos meus filmes preferidos, ainda tou pra ver filme brasileiro na mesma ordem de grandeza de Dr. Strangelove ou The godfather (o que muito me entristece, mas que me incomoda mais é que parece que os hermanos vão chegar lá antes da gente. Qualé que é, brazucada? Não pode deixar não!). Salve geral tem uma coisa que eu gosto muito: ele tem um tema. Adoro trilha sonora com tema. Achei o roteiro inteligente e sensível. No todo, o filme me impressionou bem.

Mas... Oscar? Vamos comparar por um segundo Salve geral com Onde os fracos não têm vez (No country for old men), melhor filme de 2008. Ainda tem muito o que avançar, em termos de cinema "comercial" brasileiro, não tem não?



O bandido da luz vermelha (1968)
Policial, 92 min.
Direção: Rogério Sganzerla
Roteiro: Rogério Sganzerla
Atores: Paulo Vilaça, Helena Ignez, Sérgio Hingst, Luiz Linhares, Sônia Braga, Ítala Nandi, Hélio Aguiar (narração) e outros.


Salve geral (2009)
Drama, 120 min.
Direção: Sérgio Rezende
Roteiro: Sérgio Rezende e Patrícia Andrade
Atores: Andréa Beltrão, Denise Weinberg, Lee Thalor, Bruno Perillo, Guilherme Sant'Anna, Cris Couto e outros.


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